04 novembro 2010
18 outubro 2010
Salva-me
Os dias em que a morte tenta-me com o seu mel delicioso e espesso, com a promessa de um longo repouso, com a queda lenta no mais profundo e negro dos oceanos, onde nada mais existe a não ser o silêncio e a paz. Nenhum mal mais poderá crescer nos restos apodrecidos desta mortalha, apenas restam farrapos a dançar no ar, acossados pelo vento, levados para longe, para terras que nunca visitarei.
Apenas aquelas ternas e pequenas mãos seguram com esforço, entre lágrimas gritantes, o corpo inerte ante a queda inevitável.
Salva-me...
08 outubro 2010
Slow Moves
A compromise
between honesty and lies
To lead me past
their sly disguise
My moves are slow
but soon they'll know
My moves are slow
but soon they'll know
Behind the scenes
they grow their schemes
Hiding intentions
revealing only fractions
My moves are slow
but soon they'll know
My moves are slow
but soon they'll know
They'll keep on whispering their mantras
We'll keep on whispering our mantras
They'll keep on whispering their mantras
We'll keep on whispering our mantras
My moves are slow
but soon they'll know
My moves are slow
but soon they'll know
They'll keep on whispering their mantras
We'll keep on whispering our mantras
They'll keep on whispering their mantras
22 setembro 2010
Quimera
Os olhos brancos , não turvos, apenas cegos ao sentir das cores e das formas, a boca e os ouvidos cautetizados, carne alisada e suave, para que nenhum zumbido ou insecto possa entrar, o estômago vazio, escuro e fundo, sem o choro contorcido da fome, as mãos que tocam sofregamente, por não sentir, os pés e as pernas que tentam erguer um torso sem nunca o conseguirem realizar.
Uma lagoa tranquila, ou a lucidez da mente num corpo retemperado. Um cadilho finamente polido onde a magia da alquimia pode iniciar-se... O renascer ou a criação de uma nova vida.
Uma oportunidade.
Uma ilusão.
Um sonho.
05 setembro 2010
19 agosto 2010
Escuridão
Este é o momento em que somente resta vergar os joelhos, deixar o corpo cair sobre a terra dura, pousando as mãos na fina camada de pó na sua cobertura, sentir o quente, entranhando os dedos nas suas profundezas, dilacerando a carne enquanto se afundam, sentir o vento a secar as lágrimas, o dia a amaciar o dorso despido, arrancando ternamente cada pedaço da sua forma. A cabeça baixa, junto ao peito magro com as costelas a desenharem escadas arqueadas para os vermes subirem em direcção aos seus lábios.
Nada mais resta fazer a não ser esperar. Deixar o corpo inerte, tombado sobre o húmus, apenas a aguardar que a natureza cumpra a sua promessa. Esperar que o sal e o Sol temperem esta carcaça, que os monstros espezinhem e calquem mais ainda contra o duro chão até do sangue não restar nada mais que uma pasta negra em contraste com o branco cálido do pó que os ossos secos deixam sobre o solo triste.
06 agosto 2010
18 julho 2010
05 julho 2010
27 junho 2010
22 junho 2010
Ciudade Sin Sueno
No duerme nadie por el cielo. Nadie, nadie.
No duerme nadie.
Las criaturas de la luna huelen y rondan sus cabañas.
Vendrán las iguanas vivas a morder a los hombres que no sueñan
y el que huye con el corazón roto encontrará por las esquinas
al increíble cocodrilo quieto bajo la tierna protesta de los astros.
No duerme nadie.
Las criaturas de la luna huelen y rondan sus cabañas.
Vendrán las iguanas vivas a morder a los hombres que no sueñan
y el que huye con el corazón roto encontrará por las esquinas
al increíble cocodrilo quieto bajo la tierna protesta de los astros.
No duerme nadie por el mundo. Nadie, nadie.
No duerme nadie.
Hay un muerto en el cementerio más lejano
que se queja tres años
porque tiene un paisaje seco en la rodilla;
y el niño que enterraron esta mañana lloraba tanto
que hubo necesidad de llamar a los perros para que callase.
No duerme nadie.
Hay un muerto en el cementerio más lejano
que se queja tres años
porque tiene un paisaje seco en la rodilla;
y el niño que enterraron esta mañana lloraba tanto
que hubo necesidad de llamar a los perros para que callase.
No es sueño la vida. ¡Alerta! ¡Alerta! ¡Alerta!
Nos caemos por las escaleras para comer la tierra húmeda
o subimos al filo de la nieve con el coro de las dalias muertas.
Pero no hay olvido, ni sueño:
carne viva. Los besos atan las bocas
en una maraña de venas recientes
y al que le duele su dolor le dolerá sin descanso
y al que teme la muerte la llevará sobre sus hombros.
Nos caemos por las escaleras para comer la tierra húmeda
o subimos al filo de la nieve con el coro de las dalias muertas.
Pero no hay olvido, ni sueño:
carne viva. Los besos atan las bocas
en una maraña de venas recientes
y al que le duele su dolor le dolerá sin descanso
y al que teme la muerte la llevará sobre sus hombros.
Un día
los caballos vivirán en las tabernas
y las hormigas furiosas
atacarán los cielos amarillos que se refugian en los ojos de las vacas.
los caballos vivirán en las tabernas
y las hormigas furiosas
atacarán los cielos amarillos que se refugian en los ojos de las vacas.
Otro día
veremos la resurrección de las mariposas disecadas
y aún andando por un paisaje de esponjas grises y barcos mudos
veremos brillar nuestro anillo y manar rosas de nuestra lengua.
¡Alerta! ¡Alerta! ¡Alerta!
A los que guardan todavía huellas de zarpa y aguacero,
a aquel muchacho que llora porque no sabe la invención del puente
o a aquel muerto que ya no tiene más que la cabeza y un zapato,
hay que llevarlos al muro donde iguanas y sierpes esperan,
donde espera la dentadura del oso,
donde espera la mano momificada del niño
y la piel del camello se eriza con un violento escalofrío azul.
veremos la resurrección de las mariposas disecadas
y aún andando por un paisaje de esponjas grises y barcos mudos
veremos brillar nuestro anillo y manar rosas de nuestra lengua.
¡Alerta! ¡Alerta! ¡Alerta!
A los que guardan todavía huellas de zarpa y aguacero,
a aquel muchacho que llora porque no sabe la invención del puente
o a aquel muerto que ya no tiene más que la cabeza y un zapato,
hay que llevarlos al muro donde iguanas y sierpes esperan,
donde espera la dentadura del oso,
donde espera la mano momificada del niño
y la piel del camello se eriza con un violento escalofrío azul.
No duerme nadie por el cielo. Nadie, nadie.
No duerme nadie.
Pero si alguien cierra los ojos,
¡azotadlo, hijos míos, azotadlo!
No duerme nadie.
Pero si alguien cierra los ojos,
¡azotadlo, hijos míos, azotadlo!
Haya un panorama de ojos abiertos
y amargas llagas encendidas.
y amargas llagas encendidas.
No duerme nadie por el mundo. Nadie, nadie.
Ya lo he dicho.
No duerme nadie.
Pero si alguien tiene por la noche exceso de musgo en las sienes,
abrid los escotillones para que vea bajo la luna
las copas falsas, el veneno y la calavera de los teatros.
Ya lo he dicho.
No duerme nadie.
Pero si alguien tiene por la noche exceso de musgo en las sienes,
abrid los escotillones para que vea bajo la luna
las copas falsas, el veneno y la calavera de los teatros.
19 junho 2010
Ouro
O ouro, a luz que cega, que estilhaça a carne e sublima o espírito, transformando-nos numa pira de cinzas negras, que o vento leva para longe, até nada restar que recorde a sua presença. O brilho amarelo da cobiça, cor de enxofre, nascido no Inferno, numa terra onde nada cresce, a cal viva envelhecida pelo tempo, que corrói a carne, deixando apenas os ossos para serem fustigados pelos elementos, deixando rios de pó vermelho, outrora seiva da vida, que acabam a dançar pelo ar, colorindo desta cor a Lua triste que se esforça por iluminar os ermos de uma qualquer terra esquecida. As sombras são negras, mas baixas, desenhadas por contorcidos troncos, que rangem de sofrimento, gemem de dor, enquanto se desfazem lentamente, caindo mortos na terra infértil, sob o riso dos corvos negros, depenados e infectos que guerreiam pelos despojos no chão poeirento.
O ouro, iluminado pelo quadro negro e escuro, vive solitário, perdido, esquecido, desprovido de pecado, pois agora já não existem sob o Céu vermelho os olhos vitreos onde o seu reflexo pode brilhar.
18 junho 2010
16 junho 2010
Cru
Cru, é a cor da pele quando durmo, refastelado na minha cama grande, com o som dos estores a baterem na vidraça entreaberta.
Cru, é o cheiro da erva molhada de forma mecanizada pelos aspersores que acordam durante a noite enquanto o corpo repousa sobre os lençóis nesta noite quente.
Cru, é o som dos carros, da delinquência e dos alarmes que ecoam ferozes no escuro, nas noites que têm os olhos vermelhos, injectados com o seu sangue maligno.
Cru, é o tacto suave da carne quente de uma amante, enquanto entrelaça as suas pernas em mim, com os olhos cerrados e os seios tesos pela aragem fresca que corre pela janela entreaberta.
Cru, é o sabor do prazer vazio, o alimento do corpo que não preenche a alma, a fome da tesão que não satisfaz o espírito.
Cru, é o tracto do absinto, enquanto tolda o espírito e colora as mulheres sem nome que partilham a minha cama fria.
Cru, e o adjectivo, que completa as frases, quando a luz está trémula e sem vivacidade, nas longas noites tristes e sem cor.
Cru, é o reflexo do espelho, quando quem lá está não é a mesma pessoa que num dia distante sonhei vir a ser.
Cru, é a treliça justa que une os momentos negros a todas as cores vivazes, realçando-lhes o brilho, esmerilhando as toscas pedras até as transformar em jóias reluzentes.
03 junho 2010
Incongruente
Adjectivo
in.con.gru.en.te
1. que não tem ou é contrário à congruência; ilógico; incoerente:
Dizer que 2 + 2 = 5 é incongruente.
2. não concordante, incompatível
02 junho 2010
01 junho 2010
Dias Impares?
Os dias merdosos fazem parte da fibra da vida. Aqueles em que desde o primeiro raio de luz que espreita entre as pestanas está destinado ao derradeiro desastre. Os dias em que tudo está fora de controle, em que tudo o que pode correr mal irá seguir nesse sentido, e não temos como evitar ou escapar, está escrito que assim será!
Desastres possíveis:
Faltou a água porque uma conduta na via pública foi perfurada por causa de uma obra. Banho à gato, com água do Fastio... Um luxo!
Não há electricidade porque um disjuntor foi abalroado durante a madrugado por um carro desgovernado. Fazer a barba com lâmina ás luz de vela é uma aventura, mas sobrevivi sem um único corte (que seja visível)!
Os transportes foram temporariamente suspensos por uma 'avaria técnica', não havendo previsão sobre o momento em que serão restabelecidos. Vou chegar atrasado!
O chefe acordou mal disposto e a sua falta de educação e imbecilidade estão ao rubro, no absoluto auge (apesar disso continua sem nenhum refinamento, a inteligência definitivamente já não cresce naquela careca).
O almoço estava estragado, as verduras sabem a Sonasol, o peixe queimado por fora e gelatinoso por dentro (talvez fruto de múltiplas congelações). Dieta!
Estou tranquilamente a tentar pedir um café (uma fonte de energia para conseguir suportar toda esta insanidade), e o cliente que está no balcão, já atendido, a bebericar um cálice de vinho branco, olha para traz e diz-me se tenho alguma questão para ele, pois provavelmente já o reconheci!? Pois lamento, não sei quem é, nem tenho qualquer interesse em saber, apenas pretendo ser atendido, para que possa pedir um café, negro, fumegante, retemperante!
Estou a aturar um colega de trabalho com o seu queixume do costume, desta vez, é porque foi promovido e o vencimento é pouco maior que o anterior (entre palavras refere o valor, que é por alto, o triplo do meu)! E insistentemente queixa-se da injustiça!
A entrega das compras de supermercado extraviaram-se, foi preciso ligar para ser detectado o problema, agora ninguém sabe o paradeiro das mesmas, ninguém assume a responsabilidade, e a única sugestão dada resume-se ao contacto com os serviços pós-venda no dia posterior! Entretanto alimento-me de ar... É mais saudável!
Dois delinquentes decidem afinar comigo numa arcada escura, têm mau aspecto e procuram vitimas para os seus intentos. E logo num dia como hoje! Viro as costas, pois do confronto não pode advir bom resultado (sinceramente não sei se para eles ou para mim), mas um deles decide insistir...
Noite adentro, uma amiga fala-me no computador (enquanto estou a trabalhar no mesmo, com mais janelas abertas que o velho e pobre coitado suporta, a acreditar na lentidão a que processa o que digito), colocando-me questões que desconheço, num rol infinito de acusações. Acabei por não saber qual era a questão! Se for realmente importante, voltaremos a falar...
O mau karma condensado num único e curto momento?
A pergunta prevalece: o que terei feito de mal para merecer esta tão "educativa" semana...
Amanhã será um bom dia!
P.S. A banda sonora faz esquecer todos os males!
16 maio 2010
As Palavras e Outras Maldições...
Prenuncio de sorte ou anuncio de morte, será sempre um elogio à vida.
Legado, memórias, vivências e testemunhos serão sempre dignos de ser escritos ou verbalmente contados, não como uma elevação ao ser individual, ou uma procura de protagonismos, mas a simples e singela historia de um ser humano, contada na primeira pessoa, não como aviso à navegação (porque cabe a cada um percorrer o seu próprio caminho), mas sim uma longa lengalenga com tantas palavras como os dias calcorreados, com todos os ingredientes dignos de um qualquer romance de cabeceira (pelo menos mediano, espero eu). Umas vezes contado em tempo real, outras baseado em memórias vivazes, outras germinadas da dor e do sofrimento, todas merecem ser ditas, contadas, escritas com mão firme, mesmo quando os lábios tremem, ou com voz firme, mesmo quando o peito aperta na sua forma mais dolorosa. Os dias são longos, por vezes foram meses, outros pareceram ser anos, outros ainda apenas dizimas de um segundo de vida, mas entranhados tão dentro de nós como um cancro em remissão, que teimosamente força a sua presença ao lembrar-mo-nos da sua existência pelo simples facto de abrir-mos os olhos a cada nascer do Sol.
Legado, memórias, vivências e testemunhos serão sempre dignos de ser escritos ou verbalmente contados, não como uma elevação ao ser individual, ou uma procura de protagonismos, mas a simples e singela historia de um ser humano, contada na primeira pessoa, não como aviso à navegação (porque cabe a cada um percorrer o seu próprio caminho), mas sim uma longa lengalenga com tantas palavras como os dias calcorreados, com todos os ingredientes dignos de um qualquer romance de cabeceira (pelo menos mediano, espero eu). Umas vezes contado em tempo real, outras baseado em memórias vivazes, outras germinadas da dor e do sofrimento, todas merecem ser ditas, contadas, escritas com mão firme, mesmo quando os lábios tremem, ou com voz firme, mesmo quando o peito aperta na sua forma mais dolorosa. Os dias são longos, por vezes foram meses, outros pareceram ser anos, outros ainda apenas dizimas de um segundo de vida, mas entranhados tão dentro de nós como um cancro em remissão, que teimosamente força a sua presença ao lembrar-mo-nos da sua existência pelo simples facto de abrir-mos os olhos a cada nascer do Sol.
As palavras são entidades com vida própria, trucidam-nos o cérebro, abrindo caminho pelos ossos do crânio até chegarem a boca, rasgando-a violentamente até respirarem o mesmo ar que nós, por vezes com tanta dor, a gritar, espetando as suas farpas dentro de nós, até agarrar os pulmões, dilacerando-os, expelindo-os para fora da garganta. Outras tantas, é um caldo morno que percorre o corpo, aquecendo-nos, sai suave e tranquilo por entre os lábios, com um perfume de flores, em silêncio, uma neblina matinal que dá vida, palavras mudas, que só os olhos conseguem ouvir.
Poderiam ser apenas um incontável molho de palavras aglutinadas e mal articuladas, e certamente os mais hábeis conseguem dizer o mesmo num punhado apenas, destiladas no alambique dourado da poesia, mas estas são as que nascem de dentro e saem-me projectadas entre os lábios, e que obrigam as mãos a mexerem-se.
São as que sei... e terão direito à vida como quaisquer outras!
15 maio 2010
14 maio 2010
12 maio 2010
Noite
As nuvem por vezes galopam velozes como uma debandada de animais em fuga temendo pela sua vida, depois num piscar de olhos, lentas e harmoniosas, como um bando de aves migratórias. Mas a Lua é serena, lânguida no seu semblante, brilhante como os olhos de uma amante, terna como as águas tranquilas de uma lagoa.
Estou acordado, desperto, acesso como um vaga-lume, perdido na noite, a chocar violentamente contra as luzes brilhantes. Estive aqui deitado, sobre esta verdura tenra, com o corpo nu e a alma completamente despida, as arestas dos basaltos amaciam o dorso, as agulhas dos pinheiros mais parecem terapia numa sessão de acupunctura, o seu cheiro purifica-me, os pés deliciam-se dentro de água fresca da lagoa negra enquanto as nuvens tapam com o seu véu a sensual e brilhante Lua... Uma sensação indescritível!
Estou acordado, desperto, acesso como um vaga-lume, perdido na noite, a chocar violentamente contra as luzes brilhantes. Estive aqui deitado, sobre esta verdura tenra, com o corpo nu e a alma completamente despida, as arestas dos basaltos amaciam o dorso, as agulhas dos pinheiros mais parecem terapia numa sessão de acupunctura, o seu cheiro purifica-me, os pés deliciam-se dentro de água fresca da lagoa negra enquanto as nuvens tapam com o seu véu a sensual e brilhante Lua... Uma sensação indescritível!
Este é o mesmo corpo celeste que irá preencher e iluminar todas as minhas noites escuras, durante o meu sono eterno...
Mas isso, se não se importam, fica para mais tarde!
06 maio 2010
Sobre...
Estas são as únicas flores que quero sobre a minha campa rasa. Para sentir-lhes o inconfundível odor untado da natureza quente, das memórias dos melhores momentos da minha vida... Juntem uma mão cheia de sal marinho, quebrado dos cristais formados num charco esquecido à beira mar na maré baixa, espalhem-no sobre a terra negra e serei feliz!
28 abril 2010
24 abril 2010
18 abril 2010
Door Bell
Numa casa branca, caiada de branco, junto ao mar, pelo prazer de ouvir o som do ritmo das ondas, enquanto o ar húmido trespassava-me o corpo, e sentir o seu sabor salgado nos meus lábios, e partilhar estes momentos com todos os seres que um dia cruzem o meu caminho.
29 março 2010
O Sorriso Invisível
Uma borracha feita de matéria escura, crude negro, que apagou todos os seus sorrisos, conseguiu até deformar a seu rosto, e deixou arestas reticuladas desta matéria a guardar esta porta mágica, nunca mais permitindo que sequer um esgar de felicidade saísse e vislumbrasse a luz do dia, como grifos ferozes que guardam as portas de um templo sagrado, amaldiçoando quem tenta entrar e destruindo quem se atreve a sair.
Somente alguém detentor de um poder tão intenso e um coração tão puro como as claras águas da montanha branca poderiam quebrar aquele feitiço ancestral. Alguém que conseguisse com o poder infinito da luz salvar uma alma tortuosa do seu purgatório, que com um toque terno fosse capaz de lavar a lama que ofuscava o cada vez menor brilho do seu corpo.
Já pouco ou nada importava, o final estava escrito, os sonhos foram cobertos por esfarrapadas asas negras, como a mortalha quente da morte e o seu corpo moribundo estava a ser devorado por um basilisco, numa sala escura sem espelhos que o pudessem salvar.
Destas cinzas já não deveria crescer nada mais.
Um último e profundo suspiro faltava ser vivido.
14 março 2010
Musa
Ele movia os lábios a tentar formar palavras, frases de amor, cantos de paixão, lirismos da sua saudade, mas o seu corpo estava tão fundo no oceano que tudo o que queria dizer-lhe transformava-se inevitavelmente em infindáveis pequenas bolas de ar, até estas também deixarem de existir.
06 março 2010
Grou
Que linda ave pousa sobre o baixio do lago. Voou uma grande distância, planou sobre todas as cores, percorreu um mundo inteiro, para agora finalmente permitir-se descansar, sobre as negras águas deste tranquilo lago.
As longas pernas cansadas, o corpo açoitado, a asas rígidas e as penas rasgadas, com nódoas no lugar das noutro tempo vivazes cores, uma ave digna do paraíso transmutada num parente enfezado de um qualquer abutre depenado. Uma triste imagem.
Não! Parece responder o grou no seu gesto de erguer o seu longo pescoço, retirando o pálido bico da fresca água.
O cansaço irá voar levemente junto com a aragem tranquila do lago, o pó do corpo será depositado no seu fundo (oferecendo um exótico substrato, oriundo de terras distantes), onde os lotus irão crescer e florir, assim como as cores do arco-íris da sua crista serão restituídas quando o Sol secar as negras águas das suas penas.
Dentro do peito ficaram para sempre as memórias de uma fantástica viagem, histórias para contar e emoções para recordar.
Agora, sem mais demora iria viver outra história, pois o dia já está a nascer...
As longas pernas cansadas, o corpo açoitado, a asas rígidas e as penas rasgadas, com nódoas no lugar das noutro tempo vivazes cores, uma ave digna do paraíso transmutada num parente enfezado de um qualquer abutre depenado. Uma triste imagem.
Não! Parece responder o grou no seu gesto de erguer o seu longo pescoço, retirando o pálido bico da fresca água.
O cansaço irá voar levemente junto com a aragem tranquila do lago, o pó do corpo será depositado no seu fundo (oferecendo um exótico substrato, oriundo de terras distantes), onde os lotus irão crescer e florir, assim como as cores do arco-íris da sua crista serão restituídas quando o Sol secar as negras águas das suas penas.
Dentro do peito ficaram para sempre as memórias de uma fantástica viagem, histórias para contar e emoções para recordar.
Agora, sem mais demora iria viver outra história, pois o dia já está a nascer...
01 março 2010
Silêncio...
Ficar quieto... 'Stand still' soa melhor!
A solidão está a ganhar terreno, a instalar-se confortavelmente dentro do meu espírito, a invadir-me a mente e até atrevendo-se a falar-me ao ouvido.
A casa está fria a toda e qualquer hora do dia, tudo está no seu lugar, mas estranhamente, esses lugares sempre parecem desapropriados, ou erradamente escolhidos, como naturezas mortas em pastel num infeliz e estéril quarto de hotel. Estão trinta e um graus, mas mesmo assim, parece que consigo ver a condensação do meu expirar, a música soa estranhamente profunda, quase espiritual, consigo ouvir o pesado arfar entre cada nota cantada pela Nina e os instrumento estão imparáveis, não existe silêncio, consigo ver os músicos a moverem-se, a posição dos seus rostos, o baterista, enquanto roda as escovas, arqueia os braços e respira profundamente. O ajustar do banco, primeiro um salivar, depois o acomodar das mãos ás frias teclas do piano, uma profunda inspiração, para repescar a alma do seu purgatório, para de seguida a expulsar em cada martelar, martirizando-a, amaciando-a até chegar de forma adocicada aos meus ouvidos, sedentos de carinho. É a paisagem perfeita para a voz crua desta mulher grande, cheia, forte e estranhamente sensual, que quase perfura-me os tímpanos, para resgatar a minha alma perdida.
A solidão ainda aqui está, sinto-a a apertar-me o peito, como um torniquete, que impede a música de entrar e a tristeza de sair do meu corpo moribundo.
A solidão ainda aqui está, sinto-a a apertar-me o peito, como um torniquete, que impede a música de entrar e a tristeza de sair do meu corpo moribundo.
Tenho a mente vazia, como um caldeirão de ferro forjado deixado demasiado tempo sobre o fogo, os seus líquidos à muito foram sublimados, evaporaram-se e perderam-se na neblina da sala fria, o que restou dissipou-se, deixando um odor ocre, como sangue no palato, metálico, como se conseguisse saborear o frio aço de uma espada, enquanto esta nos trespassa mortalmente. O caldeirão está vazio, começa a ver-se o rubro das chamas, a dança do fogo, o inferno vive lá dentro, tudo o que cair no seu regaço será destroçado, nunca mais ninguém saberá do seu paradeiro, será lançado no infinito esquecimento.
A negritude dentro do meu espírito quer resgatar a minha alma imortal.
Vou ficar quieto, parado, fazer-me de invisível, deixar que se canse, sugerir-lhe que pode apanhar-me em qualquer outro dia, deixa-lo tornar-se incandescente ao ponto que quando a centelha pura tocar-lhe esta seja estilhaçada e aniquilada como merece. Mas a minha luz esconde-se, creio que acreditando na nobreza do ser humano, obriga-nos a passar por todas as provas celestiais, para que possamos crescer, aprender e continuar.
Vou ficar quieto, parado, fazer-me de invisível, deixar que se canse, sugerir-lhe que pode apanhar-me em qualquer outro dia, deixa-lo tornar-se incandescente ao ponto que quando a centelha pura tocar-lhe esta seja estilhaçada e aniquilada como merece. Mas a minha luz esconde-se, creio que acreditando na nobreza do ser humano, obriga-nos a passar por todas as provas celestiais, para que possamos crescer, aprender e continuar.
Vou ficar quieto, e aprender... Para viver um dia mais, e adiar a minha morte.
16 fevereiro 2010
Elegia por um amigo
Ontem faleceu uma pessoa importante. Alguém que conheci nos últimos seis anos, por advento profissional, que para todos os efeitos foi o meu superior hierárquico. Um homem simples, em todas as facetas do seu ser. Adorei discutir, em plenos pulmões, com esta criatura, que apesar do rubor do rosto, enquanto vociferava impropérios na sua língua materna, sabia travar e assumir quem era detentor da razão , sem nunca tentar lustrar o seu cargo superior, tal como não se poupava aos elogios perante os seu ouvintes quando estes eram merecidos, da mesma forma que sempre parou para ouvir qualquer argumentação da minha pessoa, seja em qualquer circunstância que se encontrasse. Conheci-o nos últimos seis anos, coberto de um percurso profissional singelo – começou nessa empresa como “moço de armazém”, ainda adolescente, ascendeu a pulso, degrau a degrau, com uma formação académica limitada, até ao momento em que o conheci como “chefe”. No passado ano, a "sua" empresa, reconhecendo-lhe o valor, premiou-o com o cargo de “Director”. Suponho que para ele seria como atingir finalmente o cume da sua carreira profissional, a tradução de todo o empenho e dedicação, no desempenho laboral de toda a sua vida adulta. Nesse momento , tomou decisões, deixou de fumar, regrediu a sua apetência para as festas mundanas, começou seriamente a preocupar-se com a saúde... “porque as mulheres assim o exigem”, dizia-me. Comprou o ser carro topo de gama (de marca germânica, como os seu colegas, de função similar), e indagava se a indumentária estava adequada, provavelmente para agradar a nova voluptuosa e jovem namorada . Este foi um dos homens mais simples que conheci na vida. Considero que a simplicidade e humildade serão sempre grandes qualidades em qualquer ser humano!
Pouco mais de um ano, depois de ter “conquistado” este estado de vida, e após um exame médico, para resolver uma simples dor lombar, descobre que padecia de uma doença cancerígena. Primeiro afectava os pulmões, para na semana seguinte já afectar outras áreas do corpo. Tratamentos, tratamentos e mais tratamentos, sem sequer imaginar o martírio que tal possa ter sido, para no fim do passado ano ouvir a sua voz esperançada, quando interrompe telefonicamente uma reunião empresarial, para saudar todos os presentes, atrevendo-se a sugerir que em breve estaria de regresso. As boa noticias prolongaram-se, quando nas semanas seguintes revelou de forma eufórica que tinha havido uma total regressão da sua doença, assim como estaria para breve o seu anunciado regresso. As semanas iniciais deste novo ano passavam num constante adiar desse dito momento, sendo apenas o tempo suficiente para recuperar o cabelo perdido, perante a terapia agressiva, ou eventualmente para repor o animo.
Estará a perfazer agora trinta e seis horas, quando tudo foi desfeito. O estado de saúde degenerou, segui-se o internamento imediato, e o posterior resultado dramático – “só um milagre o poderá salvar” - foi o comentário de sua irmã que o acompanhou ao longo de todo o martírio.
Ontem, no final da tarde faleceu!
Ontem, no final da tarde faleceu!
Guardarei sempre boas memória desse homem simples. As nossas “guerras” acusticamente ensurdecedoras, dos momentos de folia, e das ressacas posteriores, em que comentávamos, nos corredores do local de trabalho, que já não tínhamos idade para estas “coisas”. Recordarei sempre os seu conselhos, ditos de uma forma simples, sem floreados, e sempre isentos de hipocrisia.
Pela impressão que passou tanto a mim, como espero a outras pessoas que sabem reconhecer as verdadeiras qualidades de um ser humano, o sua presença foi imprescindivel, justificando plenamente a sua passagem entre nós.
...Por estas pessoas, e por tantas outras que espero que façam parte do “meu caminho”, não vou morrer hoje... talvez noutro dia...
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